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Do bar, da casa, do povo: a história da dona de um cabaré que quer ingressar na vida política


Sabe aquelas situações em que dizemos “Isso só se vê em Natal mesmo?” Esta é uma delas. Hoje, apresento alguém que muitos já conhecem: Maria do Bar, a dona do mais antigo bordel de Natal. Mas quero apresentar também Maria das Dores, mãe, avó, amiga e que gosta de cuidar dos outros. Entre essas duas Marias, está a que deseja ingressar na vida política, atualmente candidata a vereadora.

Conhecida por sua longa trajetória na noite, Maria das Dores da Silva, 65 anos, começou sua vida como garota de programa ao trabalhar como cozinheira em uma casa de uma família rica da capital potiguar. Recém-separada, seus filhos ficavam com a mãe, que tinha mais três filhas. O salário de Maria sustentava seis pessoas, mas os insumos duravam apenas até a quinta-feira.

A governanta da casa, que sempre andava com joias e bem vestida, vendo a aflição de Maria, a convidou para sair uma noite. Ao chegar lá, Maria se deparou com uma casa cheia de homens ricos; foi sua primeira experiência no mundo da prostituição. “Naquela noite, ganhei o mesmo que ganhava em um mês como cozinheira, e na casa eu até ganhava bem”, comenta.

Na noite seguinte, Maria foi novamente, e no quarto dia pediu demissão, alugou uma casa e trouxe sua família do interior para Natal, tornando-se uma das garotas da famosa Maria Boa, mas essa história fica para outro dia.

Da Cozinha à Dona de Cabaré

“Maria Boa sempre me dava conselhos, dizia que eu tinha jeito para negócios. Ela me ensinou muito e me incentivou a juntar dinheiro. Depois que ela morreu, eu abri meu próprio espaço. Aluguei uma casa, contratei algumas meninas e comecei meu empreendimento”, explica.

Assim nasceu o Maria’s Bar, também conhecido como Cabaré de Maria. Maria não só cuidava da administração do local, como também ensinava as meninas a se comportar e assumia tarefas como cozinhar e lavar as roupas delas.

De lá saíram 19 casamentos e muitos empreendimentos, como conta Maria. “As meninas vão para lá, passam um tempo, juntam dinheiro e, quando saem, investem em alguma coisa. Uma delas tem uma empresa de telhas, outras têm casa própria; uma saiu com 400 mil e empreendeu. As que continuam na casa vivem bem. Claro que enfrentam dificuldades e preconceitos; algumas se perdem nas drogas, mas muitas conseguem melhorar de vida”, afirma.

Desde que abriu o bar, Maria deixou de fazer programas e se dedicou a fazer seu negócio dar certo. Por trás de uma história julgada por tantos, existe uma Maria que muitos não conhecem.

Maria da Família

Embora a vida noturna tenha proporcionado dignidade à sua família, também lhe roubou algo: a chance de ser uma mãe presente na educação de seus filhos. “Eu tinha medo de ir às reuniões de pais, de ir às apresentações e ser reconhecida por algum pai, receando que isso afetasse meus filhos. Isso me doía muito; eu queria estar presente e ver uma apresentação do Dia das Mães”, comenta.

Apesar disso, Maria sempre fez o possível para que seus filhos se formassem. Mãe de seis, incluindo quatro adotivos, ela investiu pesado na educação de todos. “Quem quis fazer faculdade fez. Um deles tem duas graduações. Eu não estudei, mas fiz de tudo para que eles fossem para a escola.”

Hoje, o preconceito é menor do que quando Maria abriu seu bar, mas ainda existem ocasiões em que mulheres cospem no chão ao vê-la. O preconceito e a repulsa alheia, provenientes de mulheres cujos homens frequentaram o bar de Maria, não a abalam e nunca mudaram seus desejos de ajudar os outros.

Maria gosta de trabalho braçal, de cuidar de seu sítio, de estar com a família e de passar tempo com suas meninas, conversando sobre a vida e dando conselhos. “Dizem que você nasce destinado a fazer aquilo. Acho que o meu é ajudar pessoas. Mainha sempre dizia que, quando criança, eu dividia tudo que tinha, mesmo que ficasse sem. Teve uma vez, com 4 anos, em que um homem passou pedindo lençol porque estava muito frio; eu ia dar o meu, mas minha mãe não deixou, porque só tinha aquele”, relembra.

Movida pela vontade de ajudar, desde que abriu seu negócio, Maria apoia cerca de 25 instituições, como o Juvino Barreto e o Varela Santiago. Em uma de suas propriedades, uma granja, ela encanou água para a população que vive nas redondezas, em casas de taipa. “Nunca fiz nada disso pensando em retorno. Eu nem acreditava que podia me candidatar. Ajudo porque, nessa vida, não vou levar nada, então vou fazer o bem.”

Do cabaré à vida política

Muitas pessoas começaram a sugerir que Maria se candidatasse, acreditando que ela faria uma boa gestão. No entanto, ela não acreditava que uma mulher sem estudo conseguiria se eleger. Mesmo assim, viu a oportunidade de fazer mais e se lançou como candidata a deputada estadual.

Durante a campanha, Maria ficou abalada ao notar que algumas pessoas apenas queriam crescer em cima dela e pensou em desistir. Apesar de se sentir “um nada” e decepções com falsos apoiadores, ela prosseguiu e alcançou 850 votos, um número que a surpreendeu.

Agora, em 2024, parte da história se repete. Novamente incentivada, sua relutância foi maior, primeiro porque notou que ainda havia pessoas querendo se promover em cima dela e, segundo, devido a problemas com a pessoa que cuidou de seu dinheiro na última campanha. “Em quem posso confiar?”, indaga.

A vontade de ajudar falou mais alto, desafiando seus “traumas” e a falta de apoio familiar. “Minha mãe não queria, porque viu que da outra vez me enganaram”, comenta. Agora, Maria é candidata a vereadora pelo partido PSB, com o slogan “Putaria por putaria, vote na Maria”, uma frase engraçada que, por trás, carrega a vontade de trazer esperança à população.

Suas propostas focam no Alecrim. A primeira é a criação de uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA). “É um dos bairros que mais paga impostos e não tem uma UPA? Tem que sair para a cidade da criança ou para as Rocas. Ali tem um terreno que dá certinho para colocar uma UPA”, explica, destacando a necessidade de uma infraestrutura que atenda à população local.

Além disso, ela propõe a criação de uma creche para que as mães possam trabalhar. A ideia surgiu de conversas com mulheres que trabalham com reciclagem e não têm com quem deixar os filhos, levando-os juntos. “Imagina que triste, crianças sem escola, sem saber quando vão comer, e as mães tendo que catar latinha. Quero que elas possam ter um local onde saibam que seus filhos estão seguros e alimentados”, conclui.

Maria também propõe um abrigo para moradores de rua, reconhecendo que essa população sofre não só com a falta de abrigo, mas também com a violência e o preconceito. “Existem tantos moradores de rua, e o pior é que as pessoas ainda cometem crimes contra eles”, diz com empatia.

Faltando dez dias para as eleições, Maria está feliz com a campanha que vem fazendo. Em suas andanças ela tenta desmistificar a ideia de que sua profissão a define como alguém sem caráter. Ela sabe que a essência de uma pessoa vai muito além do que faz para viver.

Em suas conversas, Maria fala sobre suas experiências e como elas moldaram sua visão de mundo. Mostra que seu trabalho a tornou mais empática e compreensiva e contra qualquer tipo de preconceito. Para ela, um grande coração é aquele que se importa e luta por um futuro melhor, e é isso que quer transmitir às pessoas.

Ela está pronta para o desafio, confiante de que seu amor por ajudar o próximo e por sua comunidade a levará adiante. Em cada passo, Maria deixa claro que sua verdadeira riqueza está em suas relações e na vontade de fazer a diferença.

Fonte: O Potengi


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Do bar, da casa, do povo: a história da dona de um cabaré que quer ingressar na vida política


Sabe aquelas situações em que dizemos “Isso só se vê em Natal mesmo?” Esta é uma delas. Hoje, apresento alguém que muitos já conhecem: Maria do Bar, a dona do mais antigo bordel de Natal. Mas quero apresentar também Maria das Dores, mãe, avó, amiga e que gosta de cuidar dos outros. Entre essas duas Marias, está a que deseja ingressar na vida política, atualmente candidata a vereadora.

Conhecida por sua longa trajetória na noite, Maria das Dores da Silva, 65 anos, começou sua vida como garota de programa ao trabalhar como cozinheira em uma casa de uma família rica da capital potiguar. Recém-separada, seus filhos ficavam com a mãe, que tinha mais três filhas. O salário de Maria sustentava seis pessoas, mas os insumos duravam apenas até a quinta-feira.

A governanta da casa, que sempre andava com joias e bem vestida, vendo a aflição de Maria, a convidou para sair uma noite. Ao chegar lá, Maria se deparou com uma casa cheia de homens ricos; foi sua primeira experiência no mundo da prostituição. “Naquela noite, ganhei o mesmo que ganhava em um mês como cozinheira, e na casa eu até ganhava bem”, comenta.

Na noite seguinte, Maria foi novamente, e no quarto dia pediu demissão, alugou uma casa e trouxe sua família do interior para Natal, tornando-se uma das garotas da famosa Maria Boa, mas essa história fica para outro dia.

Da Cozinha à Dona de Cabaré

“Maria Boa sempre me dava conselhos, dizia que eu tinha jeito para negócios. Ela me ensinou muito e me incentivou a juntar dinheiro. Depois que ela morreu, eu abri meu próprio espaço. Aluguei uma casa, contratei algumas meninas e comecei meu empreendimento”, explica.

Assim nasceu o Maria’s Bar, também conhecido como Cabaré de Maria. Maria não só cuidava da administração do local, como também ensinava as meninas a se comportar e assumia tarefas como cozinhar e lavar as roupas delas.

De lá saíram 19 casamentos e muitos empreendimentos, como conta Maria. “As meninas vão para lá, passam um tempo, juntam dinheiro e, quando saem, investem em alguma coisa. Uma delas tem uma empresa de telhas, outras têm casa própria; uma saiu com 400 mil e empreendeu. As que continuam na casa vivem bem. Claro que enfrentam dificuldades e preconceitos; algumas se perdem nas drogas, mas muitas conseguem melhorar de vida”, afirma.

Desde que abriu o bar, Maria deixou de fazer programas e se dedicou a fazer seu negócio dar certo. Por trás de uma história julgada por tantos, existe uma Maria que muitos não conhecem.

Maria da Família

Embora a vida noturna tenha proporcionado dignidade à sua família, também lhe roubou algo: a chance de ser uma mãe presente na educação de seus filhos. “Eu tinha medo de ir às reuniões de pais, de ir às apresentações e ser reconhecida por algum pai, receando que isso afetasse meus filhos. Isso me doía muito; eu queria estar presente e ver uma apresentação do Dia das Mães”, comenta.

Apesar disso, Maria sempre fez o possível para que seus filhos se formassem. Mãe de seis, incluindo quatro adotivos, ela investiu pesado na educação de todos. “Quem quis fazer faculdade fez. Um deles tem duas graduações. Eu não estudei, mas fiz de tudo para que eles fossem para a escola.”

Hoje, o preconceito é menor do que quando Maria abriu seu bar, mas ainda existem ocasiões em que mulheres cospem no chão ao vê-la. O preconceito e a repulsa alheia, provenientes de mulheres cujos homens frequentaram o bar de Maria, não a abalam e nunca mudaram seus desejos de ajudar os outros.

Maria gosta de trabalho braçal, de cuidar de seu sítio, de estar com a família e de passar tempo com suas meninas, conversando sobre a vida e dando conselhos. “Dizem que você nasce destinado a fazer aquilo. Acho que o meu é ajudar pessoas. Mainha sempre dizia que, quando criança, eu dividia tudo que tinha, mesmo que ficasse sem. Teve uma vez, com 4 anos, em que um homem passou pedindo lençol porque estava muito frio; eu ia dar o meu, mas minha mãe não deixou, porque só tinha aquele”, relembra.

Movida pela vontade de ajudar, desde que abriu seu negócio, Maria apoia cerca de 25 instituições, como o Juvino Barreto e o Varela Santiago. Em uma de suas propriedades, uma granja, ela encanou água para a população que vive nas redondezas, em casas de taipa. “Nunca fiz nada disso pensando em retorno. Eu nem acreditava que podia me candidatar. Ajudo porque, nessa vida, não vou levar nada, então vou fazer o bem.”

Do cabaré à vida política

Muitas pessoas começaram a sugerir que Maria se candidatasse, acreditando que ela faria uma boa gestão. No entanto, ela não acreditava que uma mulher sem estudo conseguiria se eleger. Mesmo assim, viu a oportunidade de fazer mais e se lançou como candidata a deputada estadual.

Durante a campanha, Maria ficou abalada ao notar que algumas pessoas apenas queriam crescer em cima dela e pensou em desistir. Apesar de se sentir “um nada” e decepções com falsos apoiadores, ela prosseguiu e alcançou 850 votos, um número que a surpreendeu.

Agora, em 2024, parte da história se repete. Novamente incentivada, sua relutância foi maior, primeiro porque notou que ainda havia pessoas querendo se promover em cima dela e, segundo, devido a problemas com a pessoa que cuidou de seu dinheiro na última campanha. “Em quem posso confiar?”, indaga.

A vontade de ajudar falou mais alto, desafiando seus “traumas” e a falta de apoio familiar. “Minha mãe não queria, porque viu que da outra vez me enganaram”, comenta. Agora, Maria é candidata a vereadora pelo partido PSB, com o slogan “Putaria por putaria, vote na Maria”, uma frase engraçada que, por trás, carrega a vontade de trazer esperança à população.

Suas propostas focam no Alecrim. A primeira é a criação de uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA). “É um dos bairros que mais paga impostos e não tem uma UPA? Tem que sair para a cidade da criança ou para as Rocas. Ali tem um terreno que dá certinho para colocar uma UPA”, explica, destacando a necessidade de uma infraestrutura que atenda à população local.

Além disso, ela propõe a criação de uma creche para que as mães possam trabalhar. A ideia surgiu de conversas com mulheres que trabalham com reciclagem e não têm com quem deixar os filhos, levando-os juntos. “Imagina que triste, crianças sem escola, sem saber quando vão comer, e as mães tendo que catar latinha. Quero que elas possam ter um local onde saibam que seus filhos estão seguros e alimentados”, conclui.

Maria também propõe um abrigo para moradores de rua, reconhecendo que essa população sofre não só com a falta de abrigo, mas também com a violência e o preconceito. “Existem tantos moradores de rua, e o pior é que as pessoas ainda cometem crimes contra eles”, diz com empatia.

Faltando dez dias para as eleições, Maria está feliz com a campanha que vem fazendo. Em suas andanças ela tenta desmistificar a ideia de que sua profissão a define como alguém sem caráter. Ela sabe que a essência de uma pessoa vai muito além do que faz para viver.

Em suas conversas, Maria fala sobre suas experiências e como elas moldaram sua visão de mundo. Mostra que seu trabalho a tornou mais empática e compreensiva e contra qualquer tipo de preconceito. Para ela, um grande coração é aquele que se importa e luta por um futuro melhor, e é isso que quer transmitir às pessoas.

Ela está pronta para o desafio, confiante de que seu amor por ajudar o próximo e por sua comunidade a levará adiante. Em cada passo, Maria deixa claro que sua verdadeira riqueza está em suas relações e na vontade de fazer a diferença.

Fonte: O Potengi


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